terça-feira, 11 de novembro de 2014

Caso Telefónica e Portugal Telecom - coima aplicada pela Comissão Europeia - Violação do artigo 101º do TFUE?





Introdução
A 23 de janeiro, a Comissão anunciou a aplicação de coimas de cerca de 66,9 milhões de euros à espanhola Telefónica e de 12,3 milhões de euros à portuguesa Portugal Telecom por terem acordado não concorrer entre si nas telecomunicações no mercado ibérico, porque viola o artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que proíbe acordos anti concorrenciais.

Neste sentido, e apesar de boa parte da informação, acerca deste processo com o número 39839 no registo de processos da Comissão Europeia, ainda se encontrar classificada como confidencial tentaremos fazer uma análise crítica deste caso, com base no artigo 101º do TFUE e do Regulamento (CE) 1/2003 do Conselho, bem como jurisprudência assente, fazendo também uma curta analise destes mesmos.

Enquadramento Legal
A[1]
Artigo 101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
1. São incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis afetar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno, designadamente as que consistam em:
a) Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transação;
b) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos;
c) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;
d) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
e) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação o objeto desses contratos.

2. São nulos os acordos ou decisões proibidos pelo presente artigo.

3. As disposições no nº 1 podem, todavia, ser declaradas inaplicáveis:
— a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre empresas,
— a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de associações de empresas, e
— a qualquer prática concertada, ou categoria de práticas concertadas, que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico, contanto que aos utilizadores se reserve uma parte equitativa do lucro daí resultante, e que:
a) Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses objetivos;
b) Nem deem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma parte substancial dos produtos em causa.

B[2]
Regulamento n.º 1/2003 do Conselho de 16 de Dezembro de 2002

Artigo 4º
Competência da Comissão
Para efeitos de aplicação dos artigos 101º e 102º do Tratado, a Comissão tem a competência atribuída nos termos do presente regulamento.

Artigo 23º
Coimas
1. A Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas e associações de empresas coimas até 1 % do volume de negócios total realizado durante o exercício precedente, sempre que, deliberadamente ou por negligência:
a) Forneçam informações inexatas ou deturpadas em resposta a um pedido apresentado nos termos do artigo 17º ou do nº 2 do artigo 18º;
b) Forneçam informaçõess inexatas, incompletas ou deturpadas ou não forneçam uma informação no prazo exigido em resposta a um pedido que lhes tenha sido dirigido por decisão tomada nos termos do artigo 17º ou do n.º 3 do artigo 18º;
c) Apresentem de forma incompleta os livros ou outros registos relativos à empresa, aquando das inspeções efetuadas nos termos do artigo 20º, ou não se sujeitem às inspeções ordenadas mediante decisão tomada nos termos do nº 4 do artigo 20º;
d) Em resposta a um pedido de explicação feito nos termos da alínea e) do nº2 do artigo 20º:
— respondam de forma inexata ou deturpada,
— não retifiquem, no prazo estabelecido pela Comissão, uma resposta inexata, incompleta ou deturpada dada por um membro do pessoal, ou
— não deem ou se recusem a dar uma resposta cabal sobre factos que se prendam com o objeto e a finalidade de uma inspeção ordenada mediante decisão tomada nos termos do nº 4 do artigo 20º;
e) Forem quebrados os selos apostos, nos termos da alínea d) do nº2 do artigo 20º, pelos funcionários ou outros acompanhantes mandatados pela Comissão.

2. A Comissão pode, mediante decisão, aplicar coimas às empresas e associações de empresas sempre que, deliberadamente ou por negligência:
a) Cometam uma infração ao disposto nos artigos 101º ou 102º do Tratado; ou
b) Não respeitem uma decisão tomada nos termos do artigo 8º que ordene medidas provisórias; ou
c) Não respeitem um compromisso tornado obrigatório por decisão tomada nos termos do artigo 9º

A coima aplicada a cada uma das empresas ou associações de empresas que tenha participado na infração não deve exceder 10 % do respetivo volume de negócios total realizado durante o exercício precedente.

Quando a infração cometida por uma associação se referir às atividades dos seus membros, a coima não deve exceder 10 % da soma do volume de negócios total de cada membro ativo no mercado cujas atividades forem afetadas pela infração da associação.

3. Quando se determinar o montante da coima, deve tomar-se em consideração a gravidade e a duração da infração.

4. Quando for aplicada uma coima a uma associação de empresas tendo em conta o volume de negócios dos seus membros e essa associação se encontrar em situação de insolvência, a associação é obrigada a apelar às contribuições dos seus membros para cobrir o montante da coima.

Se essas contribuições não tiverem sido pagas à associação no prazo fixado pela Comissão, esta pode exigir o pagamento da coima diretamente a qualquer uma das empresas cujos representantes eram membros dos órgãos diretivos envolvidos da associação.

Depois de exigir o pagamento nos termos do segundo parágrafo, a Comissão pode exigir, sempre que tal seja necessário para assegurar o pagamento total da coima, o pagamento do saldo remanescente a qualquer um dos membros da associação que estavam ativos no mercado em que foi cometida a infração.

Todavia, a Comissão não exigirá o pagamento nos termos do segundo ou terceiro parágrafos às empresas que demonstrarem não ter executado a decisão de infração da associação e que, quer a desconheciam, quer dela se tenham distanciado ativamente, antes de a Comissão ter iniciado a investigação no processo.

A responsabilidade financeira de cada empresa no tocante ao pagamento da coima não pode exceder 10 % do respetivo volume de negócios total realizado durante o exercício precedente.

5. As decisões aprovadas nos termos dos nº 1 e 2 não têm carácter penal.


Apreciação e campo de aplicação do artigo 101º do TFUE
Com o intuito de impedir que as empresas restrinjam a concorrência (interna) ou em relação a terceiros (externa), o Artigo 101º do TFUE estabelece que são nulos os “acordos entre empresas restritivas da concorrência que afetam o comércio entre os Estados-Membros” (salvo se verificarem cumulativamente as condições consagradas no nº3 dessa mesma disposição). Por outras palavras, se os acordos restritivos da concorrência gerarem simultaneamente benefícios económicos objetivos capazes de compensarem tais restrições, isto é, se o acordo for globalmente pró-concorrencial, deve ser considerado compatível com os objetivos das regras europeias da concorrência. A exceção prevista no nº3 do artigo 101º do TFUE pode ser aplicada a acordos individuais ou a categorias por regulamentos de isenção por categorias.

As destinatárias desta proibição são, deste modo, as empresas, isto é, entidades que exerçam uma atividade económica (ofereçam bens ou serviços no mercado) “independentemente do seu estatuto jurídico ou modo de financiamento”[3].

Para o direito da concorrência, a empresa é ainda vista como uma unidade económica, facto que vai influenciar o tratamento a dar as empresas dentro de um grupo. Na verdade, é jurisprudência bem assente que um grupo de empresas deve ser considerada como uma única empresa, sendo deste modo irrelevante as relações entre elas para efeitos do artigo 101º do TFUE, se essas várias empresas não têm autonomia de decisão no mercado.

Concomitantemente, no que respeita aos acordos (em sentido lato) a que se aplica a proibição do artigo 101º do TFUE, podem-se distinguir três situações. Em primeiro lugar, a norma em análise refere os acordos (acordos em sentido estrito) restritivos da concorrência. Segundo o Tribunal de Justiça, a noção de acordo exige apenas o consenso entre as partes para atuarem num certo sentido de mercado, sendo desnecessária a existência de uma convecção juridicamente vinculativa. Por outras palavras, é suficiente que as “empresas tenham expressado a sua vontade comum de se comportarem no mercado de uma forma determinada”[4]. Além disso, o comportamento anti concorrencial das empresas pode traduzir-se, quer em atos isolados, quer numa série de comportamentos, que constituem expressão de uma “infração única e complexa”. Não faria sentido, como afirma o Tribunal no acórdão Anic[5], dividir em infrações distintas “um comportamento contínuo” caracterizado por uma única finalidade: falsear a concorrência.

Os acordos entre empresas podem ser ainda horizontais (acordos entre empresas concorrentes na mesma fase de processo de produção), ou verticais (acordos entre empresas e diferentes fases desse processos), ainda que os efeitos anti concorrenciais dos primeiros, sejam segundo a experiência das autoridades da concorrência, significativamente mais gravosas do que os dos segundos.

Em segundo lugar, o artigo 101º do TFUE abrange as decisões de associações de empresas restritivas da concorrência; isto é, decisões que exprimem “ a vontade de representantes dos membros de uma profissão para que estes últimos adotem um comportamento determinado no quadro da sua atividade económica”[6]. Portanto, trata-se de uma decisão que vincula os seus membros.

Finalmente, o artigo 101º proíbe “as práticas concertadas restritivas da concorrência, ou seja, formas de cooperação informal entre as empresas sem se traduzirem num acordo propriamente dito, acabam por substituir cientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática entre elas. Segundo a jurisprudência do Tribunal, uma prática concertada envolve os seguintes elementos: existência de uma concertação entre empresas, ou seja, contactos diretos ou indiretos entre as mesmas; um comportamento no mercado” e “um nexo de causalidade”[7] entre os dois elementos.

Estabelecida a existências entre empresas, a Comissão Europeia tem de provar, por um lado, que tal acordo em sentido lato afeta, isto é, influencia atual ou potencialmente, e de forma significativa, o comércio entre os Estados-membros.

Paradoxalmente, a instituição da União deve ainda demonstrar que o acordo em causa tem por objetivo ou efeito restringir a concorrência (intermarcas e/ou intramarca). As restrições da concorrência por objetivo são, segundo a Comissão, aquelas que, pela sua natureza grave e de acordo com a experiência, se presume terem “elevado potencial em termos de efeitos negativos na concorrência e relativamente às quais não é necessário (…) demonstrar os seus efeitos concretos no mercado”[8]. Na hipótese de acordos horizontais, é o caso da fixação dos preços, limitação da produção e partilha dos mercados. Já na hipótese de acordos verticais, serão restrições por objetivo a imposição de preços fixos e mínimos de revenda e a proteção territorial absoluta (incluindo restrições em matéria de vendas passivas).

Enfim, se um acordo não restringe a concorrência em termos de objetivo, é necessário verificar, segunda a Comissão, se tem efeitos restritivos na concorrência. Deste modo, são tidos em conta os efeitos anti concorrenciais “efetivos ou potenciais”, ou seja, deve-se esperar, com um “grau de probabilidade razoável, efeitos negativos no mercado relevante a nível dos preços. Produção, inovação e variedade ou qualidade dos bens ou serviços”[9].

Apreciação do Regulamento n.º 1/2003 do Conselho de 16 de Dezembro de 2002
A aplicação dos procedimentos antitrust instaurado pelo Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho destina-se a assegurar um respeito mais efetivo das regras de concorrência da União Europeia (UE), no interesse dos consumidores e das empresas, ao mesmo tempo que reduz a burocracia que sobrecarrega as sociedades que exercem a sua atividade na Europa. Baseando-se na aplicação descentralizada das regras de concorrência e no reforço do controlo a posteriori, o presente regulamento permite, por um lado, reduzir a carga de trabalho administrativo da Comissão e, por outro, possibilitar que a Comissão concentre os seus recursos na repreensão das infrações mais graves em matéria de concorrência. Concede, ainda, mais poder às autoridades nacionais de concorrência, reforçando o seu papel, e dos órgãos jurisdicionais nacionais na aplicação do direito da concorrência da UE, garantindo ao mesmo tempo a sua aplicação uniforme e eficaz.

Assim, o presente regulamento incide sobre as modalidades de execução das disposições do TFUE relativas aos acordos, decisões de associação de empresas e práticas concertadas susceptíveis de restringir a concorrência (artigo 101.º do TFUE) e aos abusos de posição dominante (artigo 102.º do TFUE).

Poderes da Comissão Europeia
A fim de zelar pela aplicação das regras da concorrência em matéria de acordos, decisões de associações de empresas e práticas concertadas (artigo 101.º), bem como de abusos de posição dominante (artigo 102.º), susceptíveis de restringir a concorrência, a Comissão dispõe de múltiplos poderes que lhe permitem tomar decisões, efetuar inquéritos e impor sanções. Estes poderes são exercidos pela Comissão quando, com base numa denúncia ou por sua própria iniciativa, considera numa base casuística a existência de uma infração aos artigos 101.º e 102.º do TFUE.

Nos termos do Regulamento (CE) 1/2003 do Conselho, a Comissão pode, numa base casuística, tomar as seguintes decisões:
         Verificar e fazer cessar uma infração: se a Comissão verificar uma infração às disposições dos artigos 101.º ou 102.º do TFUE, pode, através de decisão, obrigar as empresas e associações de empresas em causa a pôr termo à infração verificada, ou declarar o fim de uma infração.
Ordenar medidas provisórias: nos casos justificadamente urgentes, a Comissão pode, agindo por sua iniciativa e após uma primeira verificação de infração, ordenar medidas provisórias.
Tornar obrigatórios compromissos: quando tencionar adotar uma decisão de cessação de infração e as empresas em causa assumirem compromissos que respondam às suas objeções, a Comissão pode tornar estes compromissos obrigatórios, por um período determinado. A Comissão pode reabrir o processo quando a situação de facto se alterar, quando as empresas em causa não cumprirem os seus compromissos ou quando a decisão se basear em informações incompletas, inexatas ou deturpadas.
Declarar a inaplicabilidade dos artigos 101.º e 102.º do TFUE: a Comissão pode, por razões de interesse público da UE, declarar que, em função dos elementos de que tem conhecimento, o artigo 101.º é inaplicável a um acordo, decisão de associação de empresas ou prática concertada, quer por não estarem preenchidas as condições do n.º 1 do artigo 101.º, quer porque se verificam as condições de isenção do n.º 3 do artigo 101.º. Pode proceder de igual modo nos casos de posições dominantes, previstas no artigo 102.º.

Para assegurar o correto exercício do direito de defesa, antes de tomar uma decisão a Comissão dará às empresas e associações de empresas envolvidas a oportunidade de exprimirem o seu ponto de vista relativamente às objeções por ela formuladas. As partes têm, além disso, o direito de consultar o processo da Comissão, excepto quanto a elementos protegidos por segredos comerciais. No entanto, a fim de assegurar o respeito do sigilo profissional, toda a informação recolhida só pode ser utilizada para os fins para que foi recolhida. De resto, a Comissão e as autoridades de concorrência nacionais não podem divulgar as informações que recolheram ou trocaram entre si.

A Comissão tem os seguintes poderes de investigação:
Efetuar inquéritos aos sectores: quando a evolução das trocas comerciais entre os países da UE, a rigidez dos preços, ou outras circunstâncias façam presumir que a concorrência é restringida ou falseada no mercado comum, a Comissão pode efetuar um inquérito sobre um sector económico ou sobre um tipo específico de acordos em diferentes sectores.
Solicitar informações: a Comissão pode, mediante simples pedido ou decisão, solicitar às empresas e associações de empresas as informações necessárias para cumprir as funções que lhe são atribuídas por este regulamento. Qualquer pessoa
singular ou coletiva susceptível de dispor de informações úteis deve fornecer os elementos solicitados. A Comissão pode igualmente solicitar qualquer informação necessária ao cumprimento das suas funções aos Governos e às autoridades nacionais de concorrência.
Registar declarações: a Comissão pode ouvir qualquer pessoa singular ou coletiva que dê o seu consentimento.
Proceder a inspeções: a Comissão pode proceder a todas as inspeções necessárias junto das empresas e associações de empresas, devendo estas sujeitar-se a essas inspeções. Os agentes da Comissão são investidos dos seguintes poderes:

1. Aceder às instalações, terrenos e meios de transporte das empresas e associações de empresas;

2. Aceder a quaisquer outras instalações, terrenos e meios de transporte de empresas e associações de empresas, incluindo o domicílio dos dirigentes, dos administradores ou de outros colaboradores, quando exista a suspeita razoável de que livros ou outros documentos profissionais ligados ao domínio objeto da inspeção se podem encontrar aí;

3. Inspecionar os livros, bem como qualquer outra documentação profissional;

4. Tirar cópias ou extratos dos livros e registos;

5. Apor selos em todas as instalações ou documentos profissionais durante a realização da inspeção;

6. Solicitar informações a qualquer representante ou membro do pessoal da empresa ou da associação de empresas e registar as suas respostas.

Os agentes mandatados pela Comissão exercem os seus poderes apresentando um mandado escrito, que indica o objeto e a finalidade da inspeção, bem como as eventuais sanções. A Comissão informa, em tempo útil, a autoridade de concorrência do país da UE em cujo território a inspeção terá lugar. A autoridade de concorrência de um país da UE pode igualmente, no seu território, proceder a qualquer medida de inquérito em aplicação do direito nacional, em nome e por conta da autoridade de concorrência de outro país da UE ou, quando solicitado, proceder a uma inspeção em nome da Comissão, a fim de estabelecer a existência de uma infração aos artigos 101.º ou 102.º do TFUE.

A Comissão pode aplicar às empresas e associações de empresas as seguintes sanções:
Coimas: a Comissão pode aplicar, às empresas e associações de empresas, coimas até 1% do volume de negócios total realizado durante o exercício precedente sempre que, deliberadamente ou por negligência:

1. Fornecerem informações inexatas, incompletas ou deturpadas em resposta a um pedido ou não fornecerem as informações nos prazos fixados;
2. Apresentarem, quando se efetuam inspeções, os livros ou outros documentos profissionais requeridos de forma incompleta, ou quando não se submeterem às inspeções ordenadas;

3. Se recusarem a responder a perguntas que lhes tenham sido colocadas durante uma inspeção, ou quando responderem de forma inexata, incompleta ou deturpada;

4. Os selos apostos pelos agentes mandatados pela Comissão forem quebrados.
Além disso, a Comissão pode aplicar coimas às empresas e associações de empresas até 10% do volume de negócios total realizado durante o exercício precedente por cada uma das empresas que tenham participado na infração ao disposto nos artigos 101.º ou 102.º do TFUE, quando tenham infringido uma decisão que ordena medidas provisórias ou quando não tenham respeitado um compromisso tornado obrigatório por uma decisão da Comissão.

Para determinar o montante da coima, a Comissão toma em consideração a gravidade e a duração da infração. Quando a coima é aplicada a uma associação de empresas e esta se encontrar em situação de insolvência, a Comissão pode exigir o pagamento a cada uma das empresas que eram membros da associação no momento da infração. A responsabilidade financeira de cada empresa não pode exceder 10% do seu volume de negócios total realizado durante o exercício precedente. As decisões de aplicação de coimas não têm carácter penal.

Sanções pecuniárias compulsórias: a Comissão pode também aplicar, às empresas e associações de empresas sanções pecuniárias compulsórias, até 5% do volume de negócios diário médio realizado durante o exercício precedente, por cada dia de atraso, a contar da data fixada na sua decisão, para as obrigar a:
1. Pôr termo a uma infração;
2. Cumprir uma decisão que ordene medidas provisórias;
3. Respeitar um compromisso tornado obrigatório;
4. Fornecer de forma completa e exata informações que tenha solicitado;
5. Sujeitar-se a uma inspeção que tenha ordenado.

Quando as empresas tiverem cumprido as obrigações relativamente às quais a sanção pecuniária compulsória foi infligida, a Comissão pode decidir a redução do seu montante definitivo.

O poder da Comissão para aplicar coimas ou sanções pecuniárias compulsórias prescreve após três ou cinco anos, em função da infração cometida. A prescrição, que começa a contar a partir do dia em que a infração foi cometida, é interrompida por qualquer ato da Comissão ou de uma autoridade nacional de concorrência que vise a instauração de processos relativos à infração. A prescrição fica suspensa enquanto estiver pendente recurso da decisão da Comissão perante o Tribunal de Justiça. Em contrapartida, em matéria de execução das sanções, a prescrição tem um prazo de cinco anos.

O Tribunal de Justiça analisa as decisões da Comissão, podendo opor-se a uma decisão de coima ou de sanção pecuniária compulsória pronunciada pela Comissão.

Factos
A Comissão Europeia aplicou uma coima de 66 894 000 euros à empresa Telefónica e uma coima de 12 290 000 euros à empresa Portugal Telecom por terem acordado não concorrer entre si nos mercados ibéricos das telecomunicações, em violação do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que proíbe os acordos anti concorrenciais. Em Julho de 2010, no contexto da aquisição pela empresa Telefónica do operador móvel brasileiro Vivo, que fora até então propriedade conjunta de ambas as partes, estas últimas inseriram no contrato uma cláusula na qual indicavam não concorrer entre si em Espanha e Portugal.

As partes puseram termo ao acordo de não concorrência em Fevereiro de 2011, depois de a Comissão ter iniciado um processo antitrust.

Neste sentido, o Vice-presidente da Comissão Europeia responsável pela politica da concorrência Joaquín Almunia, declarou que: «A Comissão está empenhada em assegurar a criação de um verdadeiro mercado único no setor das telecomunicações. Não toleraremos práticas anti concorrenciais de operadores estabelecidos que defendam os seus mercados nacionais, porque prejudicam os consumidores e atrasam a integração do mercado.».

Assim sendo, considerou-se que o acordo prejudicou o processo de integração do setor de telecomunicações da EU, e portanto, os acordos de não concorrência constituem uma das infrações mais graves às regras da UE em matéria de concorrência, visto poderem dar origem a preços mais elevados e a uma menor escolha para os consumidores.

Concomitantemente, a Comissão Europeia atendendo as Orientações da UE de 2006 em matéria de coimas, fixou o montante destas, tendo em conta a duração e a gravidade da infração, incluindo o facto de o acordo não ter sido mantido secreto pelas partes.

Porém, o facto de ambas as empresas terem antecipado o termo do acordo, levou a que a Comissão Europeia o tivesse em conta como circunstância atenuante.

Análise crítica do caso
No presente em análise, e com base na informação até então disponível, julgo estarmos claramente perante uma violação do Artigo 101º do TFUE, nomeadamente a alínea c) do nº1, pois a cláusula contratual presente no acordo, Aquisição da Vivo, entre as duas empresas na qual indicavam não concorrer entre si em Espanha e Portugal, é claramente uma repartição do mercado, neste caso a nível europeu e transfronteiriço.

Aliás, atendendo a que “são incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, (…) e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis afetar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno” nos termos do nº1, o presente acordo entre as duas empresas, devendo ser considerado um acordo em sentido estrito restritivo da concorrência (pois, como anteriormente referido, tratasse de um acordo em que ambas as empresas atuaram num certo sentido de mercado, sendo que, neste caso, existiu uma convenção juridicamente vinculativa). Portanto, nos termos do artigo 101º nº 2 do TFUE, este acordo é nulo.

Para além disto, no que respeita à iniciativa da Comissão Europeia, no decorrente no Regulamento (CE) nº 1/2003, é da sua competência verificar e fazer cessar uma infração, facto que legitima o seu comportamento e abertura do presente processo, que originou a coima. Para além disto, tendo em conta o mesmo regulamento, nos termos do seu artigo 23º nº2 alínea a), compete ainda à Comissão Europeia aplicar sanções, neste uma coima, pois no presente caso o acordo entre a Telefónica e Portugal Telecom viola o artigo 101º do TFUE.

Desta forma, considero acertadas e corretas as coimas aplicadas de cerca de 66,9 milhões de euros à Telefónica e de 12,3 milhões de euros à PT por terem acordado não concorrer entre si nas telecomunicações no mercado ibérico.

Conclusão
Por fim, e em jeito de conclusão considerando acertadas as coimas aplicadas às empresas Telefónica e Portugal Telecom por violarem o artigo 101º do TFUE, cabe ainda dizer que esta decisão pode definitiva, pois ambas as empresas podem recorrer interpor recurso de anulação da decisão para o Tribunal de Justiça da União Europeia, facto que a empresa Telefónica já admitiu, à data, que iria fazer e, por seu lado a empresa Portugal Telecom, na figura do seu CEO Zeinal Bava, indicou estar a ponderar o recurso, logo após ter tido a oportunidade de analisar o teor integral da referida decisão e os seus fundamentos.

Visto isto, resta-nos aguardar mais desenvolvimentos acerca deste caso, e que toda a informação deixe de ser confidencial, de forma a efetuar uma análise mais profunda e acertada do caso.





Por Pedro Pinheiro


Fevereiro de 2012



[1] Silveira, Alessandra, com colaboração de Froufe, Pedro Madeira, Tratado de Lisboa, Versão consolidada, 2ª edição atualizada, pág. 109  
[2] Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.º e 82.º do Tratado 
[3] Acórdão Hofner de 23 de Abril de 1991, proc. C-41/90  
[4] Acórdão Bayer de 6 de Janeiro de 2004, Processos Apensos C-2/01P e C-3/01P  
[5] Acórdão Anic de 8 de Julho de 1999, Proc. C-49/92  
[6] Acórdão Wouters de 19 de Fevereiro de 2002, Proc. C-309/99  
[7] Acórdão Hüls de 8 de Julho de 1999, Proc. C-199/92 
[8] Orientações da EU, relativas à aplicação do artigo 101º do TFUE 
[9] Orientações da EU, relativas à aplicação do artigo 101º do TFUE  



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