Introdução
A 23 de janeiro, a Comissão anunciou a aplicação de
coimas de cerca de 66,9 milhões de euros à espanhola Telefónica e de 12,3
milhões de euros à portuguesa Portugal Telecom por terem acordado não concorrer
entre si nas telecomunicações no mercado ibérico, porque viola o artigo 101.º
do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que proíbe acordos anti
concorrenciais.
Neste sentido, e apesar de boa parte da informação,
acerca deste processo com o número 39839 no registo de processos da Comissão
Europeia, ainda se encontrar classificada como confidencial tentaremos fazer
uma análise crítica deste caso, com base no artigo 101º do TFUE e do
Regulamento (CE) 1/2003 do Conselho, bem como jurisprudência assente, fazendo
também uma curta analise destes mesmos.
Enquadramento
Legal
A[1]
Artigo
101º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
1. São incompatíveis com o mercado interno e proibidos
todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e
todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis afetar o comércio entre os
Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou
falsear a concorrência no mercado interno, designadamente as que consistam em:
a) Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de
compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transação;
b) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o
desenvolvimento técnico ou os investimentos;
c) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;
d) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais,
condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse
facto, em desvantagem na concorrência;
e) Subordinar a celebração de contratos à aceitação,
por parte dos outros contraentes, de prestações suplementares que, pela sua
natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação o objeto desses
contratos.
2. São nulos os acordos ou decisões proibidos pelo
presente artigo.
3. As disposições no nº 1 podem, todavia, ser
declaradas inaplicáveis:
— a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre
empresas,
— a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de
associações de empresas, e
— a qualquer prática concertada, ou categoria de
práticas concertadas, que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição
dos produtos ou para promover o progresso técnico ou económico, contanto que
aos utilizadores se reserve uma parte equitativa do lucro daí resultante, e
que:
a) Não imponham às empresas em
causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses
objetivos;
b) Nem deem a essas empresas a
possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma parte substancial
dos produtos em causa.
B[2]
Regulamento
n.º 1/2003 do Conselho de 16 de Dezembro de 2002
Artigo
4º
Competência
da Comissão
Para efeitos de aplicação dos artigos 101º e 102º do
Tratado, a Comissão tem a competência atribuída nos termos do presente
regulamento.
Artigo
23º
Coimas
1. A Comissão pode, mediante decisão, aplicar às
empresas e associações de empresas coimas até 1 % do volume de negócios total
realizado durante o exercício precedente, sempre que, deliberadamente ou por
negligência:
a) Forneçam informações inexatas
ou deturpadas em resposta a um pedido apresentado nos termos do artigo 17º ou
do nº 2 do artigo 18º;
b) Forneçam informaçõess inexatas,
incompletas ou deturpadas ou não forneçam uma informação no prazo exigido em
resposta a um pedido que lhes tenha sido dirigido por decisão tomada nos termos
do artigo 17º ou do n.º 3 do artigo 18º;
c) Apresentem de forma incompleta
os livros ou outros registos relativos à empresa, aquando das inspeções
efetuadas nos termos do artigo 20º, ou não se sujeitem às inspeções ordenadas
mediante decisão tomada nos termos do nº 4 do artigo 20º;
d) Em resposta a um pedido de
explicação feito nos termos da alínea e) do nº2 do artigo 20º:
— respondam de forma inexata ou deturpada,
— não retifiquem, no prazo estabelecido pela
Comissão, uma resposta inexata, incompleta ou deturpada dada por um membro do
pessoal, ou
— não deem ou se recusem a dar uma resposta cabal
sobre factos que se prendam com o objeto e a finalidade de uma inspeção
ordenada mediante decisão tomada nos termos do nº 4 do artigo 20º;
e) Forem quebrados os selos
apostos, nos termos da alínea d) do nº2 do artigo 20º, pelos funcionários ou
outros acompanhantes mandatados pela Comissão.
2. A Comissão pode, mediante decisão, aplicar coimas às
empresas e associações de empresas sempre que, deliberadamente ou por negligência:
a) Cometam uma infração ao
disposto nos artigos 101º ou 102º do Tratado; ou
b) Não respeitem uma decisão
tomada nos termos do artigo 8º que ordene medidas provisórias; ou
c) Não respeitem um compromisso
tornado obrigatório por decisão tomada nos termos do artigo 9º
A coima aplicada a cada uma das empresas ou
associações de empresas que tenha participado na infração não deve exceder 10 %
do respetivo volume de negócios total realizado durante o exercício precedente.
Quando a infração cometida por uma associação se
referir às atividades dos seus membros, a coima não deve exceder 10 % da soma
do volume de negócios total de cada membro ativo no mercado cujas atividades
forem afetadas pela infração da associação.
3. Quando se determinar o montante da coima, deve
tomar-se em consideração a gravidade e a duração da infração.
4. Quando for aplicada uma coima a uma associação de
empresas tendo em conta o volume de negócios dos seus membros e essa associação
se encontrar em situação de insolvência, a associação é obrigada a apelar às
contribuições dos seus membros para cobrir o montante da coima.
Se essas contribuições não tiverem sido pagas à
associação no prazo fixado pela Comissão, esta pode exigir o pagamento da coima
diretamente a qualquer uma das empresas cujos representantes eram membros dos
órgãos diretivos envolvidos da associação.
Depois de exigir o pagamento nos termos do segundo
parágrafo, a Comissão pode exigir, sempre que tal seja necessário para
assegurar o pagamento total da coima, o pagamento do saldo remanescente a
qualquer um dos membros da associação que estavam ativos no mercado em que foi
cometida a infração.
Todavia, a Comissão não exigirá o pagamento nos
termos do segundo ou terceiro parágrafos às empresas que demonstrarem não ter
executado a decisão de infração da associação e que, quer a desconheciam, quer
dela se tenham distanciado ativamente, antes de a Comissão ter iniciado a
investigação no processo.
A responsabilidade financeira de cada empresa no
tocante ao pagamento da coima não pode exceder 10 % do respetivo volume de
negócios total realizado durante o exercício precedente.
5. As decisões aprovadas nos termos dos nº 1 e 2 não
têm carácter penal.
Apreciação
e campo de aplicação do artigo 101º do TFUE
Com o intuito de impedir que as empresas restrinjam
a concorrência (interna) ou em relação a terceiros (externa), o Artigo 101º do
TFUE estabelece que são nulos os “acordos entre empresas restritivas da
concorrência que afetam o comércio entre os Estados-Membros” (salvo se verificarem
cumulativamente as condições consagradas no nº3 dessa mesma disposição). Por
outras palavras, se os acordos restritivos da concorrência gerarem
simultaneamente benefícios económicos objetivos capazes de compensarem tais
restrições, isto é, se o acordo for globalmente pró-concorrencial, deve ser
considerado compatível com os objetivos das regras europeias da concorrência. A
exceção prevista no nº3 do artigo 101º do TFUE pode ser aplicada a acordos
individuais ou a categorias por regulamentos de isenção por categorias.
As destinatárias desta proibição são, deste modo, as
empresas, isto é, entidades que exerçam uma atividade económica (ofereçam bens
ou serviços no mercado) “independentemente do seu estatuto jurídico ou modo de
financiamento”[3].
Para o direito da concorrência, a empresa é ainda
vista como uma unidade económica, facto que vai influenciar o tratamento a dar
as empresas dentro de um grupo. Na verdade, é jurisprudência bem assente que um
grupo de empresas deve ser considerada como uma única empresa, sendo deste modo
irrelevante as relações entre elas para efeitos do artigo 101º do TFUE, se
essas várias empresas não têm autonomia de decisão no mercado.
Concomitantemente, no que respeita aos acordos (em
sentido lato) a que se aplica a proibição do artigo 101º do TFUE, podem-se
distinguir três situações. Em primeiro lugar, a norma em análise refere os
acordos (acordos em sentido estrito) restritivos da concorrência. Segundo o
Tribunal de Justiça, a noção de acordo exige apenas o consenso entre as partes
para atuarem num certo sentido de mercado, sendo desnecessária a existência de
uma convecção juridicamente vinculativa. Por outras palavras, é suficiente que
as “empresas tenham expressado a sua vontade comum de se comportarem no mercado
de uma forma determinada”[4].
Além disso, o comportamento anti concorrencial das empresas pode traduzir-se,
quer em atos isolados, quer numa série de comportamentos, que constituem
expressão de uma “infração única e complexa”. Não faria sentido, como afirma o
Tribunal no acórdão Anic[5],
dividir em infrações distintas “um comportamento contínuo” caracterizado por
uma única finalidade: falsear a concorrência.
Os acordos entre empresas podem ser ainda
horizontais (acordos entre empresas concorrentes na mesma fase de processo de
produção), ou verticais (acordos entre empresas e diferentes fases desse
processos), ainda que os efeitos anti concorrenciais dos primeiros, sejam
segundo a experiência das autoridades da concorrência, significativamente mais
gravosas do que os dos segundos.
Em segundo lugar, o artigo 101º do TFUE abrange as
decisões de associações de empresas restritivas da concorrência; isto é,
decisões que exprimem “ a vontade de representantes dos membros de uma
profissão para que estes últimos adotem um comportamento determinado no quadro
da sua atividade económica”[6].
Portanto, trata-se de uma decisão que vincula os seus membros.
Finalmente, o artigo 101º proíbe “as práticas
concertadas restritivas da concorrência, ou seja, formas de cooperação informal
entre as empresas sem se traduzirem num acordo propriamente dito, acabam por
substituir cientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática
entre elas. Segundo a jurisprudência do Tribunal, uma prática concertada
envolve os seguintes elementos: existência de uma concertação entre empresas,
ou seja, contactos diretos ou indiretos entre as mesmas; um comportamento no
mercado” e “um nexo de causalidade”[7]
entre os dois elementos.
Estabelecida a existências entre empresas, a
Comissão Europeia tem de provar, por um lado, que tal acordo em sentido lato
afeta, isto é, influencia atual ou potencialmente, e de forma significativa, o
comércio entre os Estados-membros.
Paradoxalmente, a instituição da União deve ainda
demonstrar que o acordo em causa tem por objetivo ou efeito restringir a
concorrência (intermarcas e/ou intramarca). As restrições da concorrência por
objetivo são, segundo a Comissão, aquelas que, pela sua natureza grave e de
acordo com a experiência, se presume terem “elevado potencial em termos de
efeitos negativos na concorrência e relativamente às quais não é necessário (…)
demonstrar os seus efeitos concretos no mercado”[8].
Na hipótese de acordos horizontais, é o caso da fixação dos preços, limitação
da produção e partilha dos mercados. Já na hipótese de acordos verticais, serão
restrições por objetivo a imposição de preços fixos e mínimos de revenda e a
proteção territorial absoluta (incluindo restrições em matéria de vendas
passivas).
Enfim, se um acordo não restringe a concorrência em
termos de objetivo, é necessário verificar, segunda a Comissão, se tem efeitos
restritivos na concorrência. Deste modo, são tidos em conta os efeitos anti
concorrenciais “efetivos ou potenciais”, ou seja, deve-se esperar, com um “grau
de probabilidade razoável, efeitos negativos no mercado relevante a nível dos
preços. Produção, inovação e variedade ou qualidade dos bens ou serviços”[9].
Apreciação
do Regulamento n.º 1/2003 do Conselho de 16 de Dezembro de 2002
A aplicação dos procedimentos antitrust instaurado
pelo Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho destina-se a assegurar um respeito
mais efetivo das regras de concorrência da União Europeia (UE), no interesse
dos consumidores e das empresas, ao mesmo tempo que reduz a burocracia que
sobrecarrega as sociedades que exercem a sua atividade na Europa. Baseando-se
na aplicação descentralizada das regras de concorrência e no reforço do
controlo a posteriori, o presente regulamento permite, por um lado,
reduzir a carga de trabalho administrativo da Comissão e, por outro,
possibilitar que a Comissão concentre os seus recursos na repreensão das
infrações mais graves em matéria de concorrência. Concede, ainda, mais poder às
autoridades nacionais de concorrência, reforçando o seu papel, e dos órgãos
jurisdicionais nacionais na aplicação do direito da concorrência da UE,
garantindo ao mesmo tempo a sua aplicação uniforme e eficaz.
Assim, o presente regulamento incide sobre as
modalidades de execução das disposições do TFUE relativas aos acordos, decisões
de associação de empresas e práticas concertadas susceptíveis de restringir a
concorrência (artigo 101.º do TFUE) e aos abusos de posição dominante (artigo
102.º do TFUE).
Poderes
da Comissão Europeia
A fim de zelar pela aplicação das regras da
concorrência em matéria de acordos, decisões de associações de empresas e
práticas concertadas (artigo 101.º), bem como de abusos de posição dominante
(artigo 102.º), susceptíveis de restringir a concorrência, a Comissão dispõe de
múltiplos poderes que lhe permitem tomar decisões, efetuar inquéritos e impor
sanções. Estes poderes são exercidos pela Comissão quando, com base numa denúncia
ou por sua própria iniciativa, considera numa base casuística a existência de
uma infração aos artigos 101.º e 102.º do TFUE.
Nos termos do Regulamento (CE) 1/2003 do Conselho, a
Comissão pode, numa base casuística, tomar as seguintes decisões:
Verificar e fazer cessar uma infração: se a
Comissão verificar uma infração às disposições dos artigos 101.º ou 102.º do
TFUE, pode, através de decisão, obrigar as empresas e associações de empresas
em causa a pôr termo à infração verificada, ou declarar o fim de uma infração.
Ordenar medidas provisórias: nos casos
justificadamente urgentes, a Comissão pode, agindo por sua iniciativa e após
uma primeira verificação de infração, ordenar medidas provisórias.
Tornar obrigatórios compromissos: quando
tencionar adotar uma decisão de cessação de infração e as empresas em causa
assumirem compromissos que respondam às suas objeções, a Comissão pode tornar
estes compromissos obrigatórios, por um período determinado. A Comissão pode
reabrir o processo quando a situação de facto se alterar, quando as empresas em
causa não cumprirem os seus compromissos ou quando a decisão se basear em
informações incompletas, inexatas ou deturpadas.
Declarar a inaplicabilidade dos artigos
101.º e 102.º do TFUE: a Comissão pode, por razões de interesse público da
UE, declarar que, em função dos elementos de que tem conhecimento, o artigo
101.º é inaplicável a um acordo, decisão de associação de empresas ou prática
concertada, quer por não estarem preenchidas as condições do n.º 1 do artigo
101.º, quer porque se verificam as condições de isenção do n.º 3 do artigo
101.º. Pode proceder de igual modo nos casos de posições dominantes, previstas
no artigo 102.º.
Para assegurar o correto exercício do direito de
defesa, antes de tomar uma decisão a Comissão dará às empresas e associações de
empresas envolvidas a oportunidade de exprimirem o seu ponto de vista
relativamente às objeções por ela formuladas. As partes têm, além disso, o
direito de consultar o processo da Comissão, excepto quanto a elementos
protegidos por segredos comerciais. No entanto, a fim de assegurar o respeito
do sigilo profissional, toda a informação recolhida só pode ser utilizada para
os fins para que foi recolhida. De resto, a Comissão e as autoridades de concorrência
nacionais não podem divulgar as informações que recolheram ou trocaram entre
si.
A Comissão tem os seguintes poderes de investigação:
Efetuar inquéritos aos sectores: quando
a evolução das trocas comerciais entre os países da UE, a rigidez dos preços,
ou outras circunstâncias façam presumir que a concorrência é restringida ou
falseada no mercado comum, a Comissão pode efetuar um inquérito sobre um sector
económico ou sobre um tipo específico de acordos em diferentes sectores.
Solicitar informações: a Comissão pode,
mediante simples pedido ou decisão, solicitar às empresas e associações de
empresas as informações necessárias para cumprir as funções que lhe são
atribuídas por este regulamento. Qualquer pessoa
singular ou coletiva susceptível de dispor de
informações úteis deve fornecer os elementos solicitados. A Comissão pode igualmente
solicitar qualquer informação necessária ao cumprimento das suas funções aos
Governos e às autoridades nacionais de concorrência.
Registar declarações: a Comissão pode
ouvir qualquer pessoa singular ou coletiva que dê o seu consentimento.
Proceder a inspeções: a Comissão pode
proceder a todas as inspeções necessárias junto das empresas e associações de
empresas, devendo estas sujeitar-se a essas inspeções. Os agentes da Comissão
são investidos dos seguintes poderes:
1. Aceder às instalações, terrenos e meios de
transporte das empresas e associações de empresas;
2. Aceder a quaisquer outras instalações, terrenos e
meios de transporte de empresas e associações de empresas, incluindo o
domicílio dos dirigentes, dos administradores ou de outros colaboradores,
quando exista a suspeita razoável de que livros ou outros documentos
profissionais ligados ao domínio objeto da inspeção se podem encontrar aí;
3. Inspecionar os livros, bem como qualquer outra
documentação profissional;
4. Tirar cópias ou extratos dos livros e registos;
5. Apor selos em todas as instalações ou documentos
profissionais durante a realização da inspeção;
6. Solicitar informações a qualquer representante ou
membro do pessoal da empresa ou da associação de empresas e registar as suas
respostas.
Os agentes mandatados pela Comissão exercem os seus
poderes apresentando um mandado escrito, que indica o objeto e a finalidade da
inspeção, bem como as eventuais sanções. A Comissão informa, em tempo útil, a
autoridade de concorrência do país da UE em cujo território a inspeção terá
lugar. A autoridade de concorrência de um país da UE pode igualmente, no seu
território, proceder a qualquer medida de inquérito em aplicação do direito
nacional, em nome e por conta da autoridade de concorrência de outro país da UE
ou, quando solicitado, proceder a uma inspeção em nome da Comissão, a fim de
estabelecer a existência de uma infração aos artigos 101.º ou 102.º do TFUE.
A Comissão pode aplicar às empresas e associações de
empresas as seguintes sanções:
Coimas: a Comissão pode aplicar, às
empresas e associações de empresas, coimas até 1% do volume de negócios total
realizado durante o exercício precedente sempre que, deliberadamente ou por
negligência:
1. Fornecerem informações inexatas, incompletas ou
deturpadas em resposta a um pedido ou não fornecerem as informações nos prazos
fixados;
2. Apresentarem, quando se efetuam inspeções, os livros
ou outros documentos profissionais requeridos de forma incompleta, ou quando
não se submeterem às inspeções ordenadas;
3. Se recusarem a responder a perguntas que lhes tenham
sido colocadas durante uma inspeção, ou quando responderem de forma inexata,
incompleta ou deturpada;
4. Os selos apostos pelos agentes mandatados pela
Comissão forem quebrados.
Além disso, a Comissão pode aplicar coimas às
empresas e associações de empresas até 10% do volume de negócios total
realizado durante o exercício precedente por cada uma das empresas que tenham
participado na infração ao disposto nos artigos 101.º ou 102.º do TFUE, quando
tenham infringido uma decisão que ordena medidas provisórias ou quando não
tenham respeitado um compromisso tornado obrigatório por uma decisão da
Comissão.
Para determinar o montante da coima, a Comissão toma
em consideração a gravidade e a duração da infração. Quando a coima é aplicada
a uma associação de empresas e esta se encontrar em situação de insolvência, a
Comissão pode exigir o pagamento a cada uma das empresas que eram membros da
associação no momento da infração. A responsabilidade financeira de cada
empresa não pode exceder 10% do seu volume de negócios total realizado durante
o exercício precedente. As decisões de aplicação de coimas não têm carácter
penal.
Sanções pecuniárias compulsórias: a
Comissão pode também aplicar, às empresas e associações de empresas sanções
pecuniárias compulsórias, até 5% do volume de negócios diário médio realizado
durante o exercício precedente, por cada dia de atraso, a contar da data fixada
na sua decisão, para as obrigar a:
1. Pôr termo a uma infração;
2. Cumprir uma decisão que ordene medidas provisórias;
3. Respeitar um compromisso tornado obrigatório;
4. Fornecer de forma completa e exata informações que
tenha solicitado;
5. Sujeitar-se a uma inspeção que tenha ordenado.
Quando as empresas tiverem cumprido as obrigações
relativamente às quais a sanção pecuniária compulsória foi infligida, a
Comissão pode decidir a redução do seu montante definitivo.
O poder da Comissão para aplicar coimas ou sanções
pecuniárias compulsórias prescreve após três ou cinco anos, em função da
infração cometida. A prescrição, que começa a contar a partir do dia em que a
infração foi cometida, é interrompida por qualquer ato da Comissão ou de uma
autoridade nacional de concorrência que vise a instauração de processos
relativos à infração. A prescrição fica suspensa enquanto estiver pendente
recurso da decisão da Comissão perante o Tribunal de Justiça. Em contrapartida,
em matéria de execução das sanções, a prescrição tem um prazo de cinco anos.
O Tribunal de Justiça analisa as decisões da
Comissão, podendo opor-se a uma decisão de coima ou de sanção pecuniária
compulsória pronunciada pela Comissão.
Factos
A Comissão Europeia aplicou uma coima de 66 894 000
euros à empresa Telefónica e uma coima de 12 290 000 euros à empresa Portugal
Telecom por terem acordado não concorrer entre si nos mercados ibéricos das
telecomunicações, em violação do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento
da União Europeia (TFUE), que proíbe os acordos anti concorrenciais. Em Julho
de 2010, no contexto da aquisição pela empresa Telefónica do operador móvel
brasileiro Vivo, que fora até então propriedade conjunta de ambas as partes,
estas últimas inseriram no contrato uma cláusula na qual indicavam não
concorrer entre si em Espanha e Portugal.
As partes puseram termo ao acordo de não
concorrência em Fevereiro de 2011, depois de a Comissão ter iniciado um
processo antitrust.
Neste sentido, o Vice-presidente da Comissão
Europeia responsável pela politica da concorrência Joaquín Almunia, declarou
que: «A Comissão está empenhada em assegurar a criação de um verdadeiro mercado
único no setor das telecomunicações. Não toleraremos práticas anti concorrenciais
de operadores estabelecidos que defendam os seus mercados nacionais, porque
prejudicam os consumidores e atrasam a integração do mercado.».
Assim sendo, considerou-se que o acordo prejudicou o
processo de integração do setor de telecomunicações da EU, e portanto, os
acordos de não concorrência constituem uma das infrações mais graves às regras
da UE em matéria de concorrência, visto poderem dar origem a preços mais
elevados e a uma menor escolha para os consumidores.
Concomitantemente, a Comissão Europeia atendendo as
Orientações da UE de 2006 em matéria de coimas, fixou o montante destas, tendo
em conta a duração e a gravidade da infração, incluindo o facto de o acordo não
ter sido mantido secreto pelas partes.
Porém, o facto de ambas as empresas terem antecipado
o termo do acordo, levou a que a Comissão Europeia o tivesse em conta como
circunstância atenuante.
Análise
crítica do caso
No presente em análise, e com base na informação até
então disponível, julgo estarmos claramente perante uma violação do Artigo 101º
do TFUE, nomeadamente a alínea c) do nº1, pois a cláusula contratual presente
no acordo, Aquisição da Vivo, entre as duas empresas na qual indicavam não
concorrer entre si em Espanha e Portugal, é claramente uma repartição do
mercado, neste caso a nível europeu e transfronteiriço.
Aliás, atendendo a que “são incompatíveis com o
mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, (…) e todas as
práticas concertadas que sejam susceptíveis afetar o comércio entre os Estados-Membros
e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a
concorrência no mercado interno” nos termos do nº1, o presente acordo entre as
duas empresas, devendo ser considerado um acordo em sentido estrito restritivo
da concorrência (pois, como anteriormente referido, tratasse de um acordo em
que ambas as empresas atuaram num certo sentido de mercado, sendo que, neste
caso, existiu uma convenção juridicamente vinculativa). Portanto, nos termos do
artigo 101º nº 2 do TFUE, este acordo é nulo.
Para além disto, no que respeita à iniciativa da
Comissão Europeia, no decorrente no Regulamento (CE) nº 1/2003, é da sua
competência verificar e fazer cessar uma infração, facto que legitima o seu
comportamento e abertura do presente processo, que originou a coima. Para além
disto, tendo em conta o mesmo regulamento, nos termos do seu artigo 23º nº2
alínea a), compete ainda à Comissão Europeia aplicar sanções, neste uma coima,
pois no presente caso o acordo entre a Telefónica e Portugal Telecom viola o
artigo 101º do TFUE.
Desta forma, considero acertadas e corretas as
coimas aplicadas de cerca de 66,9 milhões de euros à Telefónica e de 12,3
milhões de euros à PT por terem acordado não concorrer entre si nas
telecomunicações no mercado ibérico.
Conclusão
Por fim, e em jeito de conclusão considerando
acertadas as coimas aplicadas às empresas Telefónica e Portugal Telecom por
violarem o artigo 101º do TFUE, cabe ainda dizer que esta decisão pode
definitiva, pois ambas as empresas podem recorrer interpor recurso de anulação
da decisão para o Tribunal de Justiça da União Europeia, facto que a empresa
Telefónica já admitiu, à data, que iria fazer e, por seu lado a empresa
Portugal Telecom, na figura do seu CEO Zeinal Bava, indicou estar a ponderar o
recurso, logo após ter tido a oportunidade de analisar o teor integral da
referida decisão e os seus fundamentos.
Visto isto, resta-nos aguardar mais desenvolvimentos
acerca deste caso, e que toda a informação deixe de ser confidencial, de forma
a efetuar uma análise mais profunda e acertada do caso.
Por Pedro Pinheiro
Fevereiro de 2012
[1] Silveira,
Alessandra, com colaboração de Froufe, Pedro Madeira, Tratado de Lisboa,
Versão consolidada, 2ª edição atualizada, pág. 109
[2] Regulamento
(CE) n.º 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das
regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.º e 82.º do Tratado
[3] Acórdão Hofner
de 23 de Abril de 1991, proc. C-41/90
[4] Acórdão Bayer
de 6 de Janeiro de 2004, Processos Apensos C-2/01P e C-3/01P
[5] Acórdão Anic
de 8 de Julho de 1999, Proc. C-49/92
[6] Acórdão Wouters
de 19 de Fevereiro de 2002, Proc. C-309/99
[7] Acórdão
Hüls de 8 de Julho de 1999, Proc. C-199/92
[8] Orientações
da EU, relativas à aplicação do artigo 101º do TFUE
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