terça-feira, 11 de novembro de 2014

O Direito Europeu do Ambiente – avaliação do impacte no ambiente e a jurisprudência do TJUE





O direito Europeu do Ambiente: breves considerações introdutórias
A União Europeia, na altura comunidade europeia começou por introduzir a protecção do ambiente através das chamadas “ barreiras verdes”, as normas ambientais e a importância dos problemas ambientais começaram por ser discutidos em 1967. Em 1967, foi criado a primeira norma sobre o ambiente dentro da União Europeia que foi a directiva 67/548 da CEE sobre as etiquetas e embalagem de substâncias perigosas. Ao longo dos anos setenta surgiram mais instrumentos comunitários amigos do ambiente tais como a directiva sobre os níveis de ruídos ( Directiva 70/157) e a directiva sobre as emissões de gases contaminantes por veículos a motor ( Directiva 70/220). Nos tratados constitutivos a protecção do ambiente começou por ser progressivamente introduzida mas não de forma expressa e objectiva, começou por haver algumas notas relativas ao ambiente nomeadamente no tratado CECA ( comunidade europeia do carvão e do aço) e no tratado europeu sobre a energia atómica ( EURATOM). Em 1972 a Cimeira de Parais instituiu as primeiras declarações da Comunidade sobre a proteção do ambiente e a preocupação ambiental onde criou-se um grupo de trabalho para a elaboração de um programa para a proteção ambiental. A Rotulagem CE dos produtos sobre a embalagem, onde surgem as diretivas em termos de poluição sonora , e de preservação das árvores através da diretiva conhecida como “ Aves” de 1979 também foram grandes avanços para a proteção ambiental. Essas diretivas tinham como fundamentação jurídica a clausula de flexibilidade ou seja a fundamentação do ambiente passava pelo desenvolvimento económico e do mercado comum através da melhoria da qualidade de vida. Em 1986 o Acto Único Europeu assume a constitucionalização da proteção do ambiente prevê se a proteção do ambiente de forma autónoma. O tratado de Lisboa consagra hoje no seu artigo 191 a 193 a proteção do ambiente, e introduz uma novidade quanto a preocupação pelas alterações climáticas e quanto à proteção do anima. Temos que notar que com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa e consequentemente da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que consagra a proteção do ambiente no artigo 37º também ai passou se a garantir que o ambiente é uma preocupação que goza do estatuto de direito fundamental. Aliás o ambiente é uma preocupação que demonstrou se imporatantissima para os cidadãos da união europeia uma vez que uma das primeiras iniciativas cidadania ( previsto nos direitos dos cidadãos europeus) foi precisamente de fazer uma petição sobre às àguas que está atualmente sobre a mesa da Comissão Europeia . Por último convém referirmos o art.3ºn3 do Tratado da União Europeia que consagra o desenvolvimento sustentável como uma preocupação da União, assim como os princípios do ambiente ( do TFUE), nomeadamente o principio da prevenção da fonte, o principio do poluidor pagador, entre outros. A nossa análise aqui hoje vai ser sobre a jurisprudência do TJUE que também sempre se demonstrou como um amigo do ambiente nas suas decisões, assim como sobre as tentativas de criação de novos instrumentos jurídicos comunitários para consagrar proteção penal europeia do ambiente.

Jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre a avaliação de efeitos no ambiente :
O Acórdão Karnten de 10 dezembro 2009.
Este Acórdão[1] tem por objeto um reenvio prejudicial sobre o artigo 234º CE , onde se poe em causa o conceito de órgão jurisdicional nacional, nomeadamente quanto a sua admissibilidade perante a diretiva 85/337/ CE sobre a avaliação de efeitos no ambiente, nomeadamente quando está em causa uma construção de uma linha aérea para o transporte de eletricidade com um comprimento superior a 15 km numa zona transfronteiriça que pode estar abrangida ou não pela avaliação consoante as dimensões do projeto .

Neste processo, o TJ foi confrontado com uma questão prejudicial a propósito da interpretação do ponto 20 do Anexo I da Diretiva 85/337/CEE do Conselho de 27 junho de 1995 relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente. A questão versa sobre a instalação de uma linha aérea de transporte de eletricidade que vai ser projetada para o território de dois ou mais Estados-Membros. O Umweltsenat pretendia saber principalmente se a Diretiva 85/337 devia ser interpretada no sentido de obrigar um Estado-Membro (Áustria) a prever uma obrigação de avaliação dos projetos referidos no ponto 20 do Anexo I da diretiva (relativo à construção de linhas áreas de transporte de eletricidade com uma tensão igual ou superior a 220 kV e cujo comprimento seja superior a 15 km), quando está em causa uma instalação projetada para o território de dois ou mais Estados-Membros (Áustria e Itália), se o limiar de 15 km na origem dessa obrigação não é atingindo ou excedido pelo Estado-Membro da instalação no seu território, mas sim pela soma das partes da instalação projetadas para os Estados vizinhos.

O TJ começou por analisar a admissibilidade da questão prejudicial colocada, pois era questionada a natureza jurisdicional ou administrativa do Umweltsenat. O TJ afirmou que, ao abrigo do artigo 267.º TFUE, o Umweltsenat preenchia os critérios para ser qualificado como órgão jurisdicional, sendo, por isso, a questão prejudicial admissível.

Quanto ao objeto da questão prejudicial, foi igualmente questionado o carácter hipotético das questões de direito comunitário suscitadas. O TJ não considerou ser o caso, na medida em que era chamado a fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio elementos de interpretação da Diretiva 85/337 que lhe permitiam apreciar se o projeto em causa era ou não abrangido pelas obrigações previstas nessa diretiva, quando o próprio direito nacional não prevê tais obrigações de natureza processual para aquele mesmo projeto.

Quanto ao mérito, o TJ pronunciou-se no sentido de que, ao abrigo dos artigos 2.°, n.° 1, e 4.°, n.° 1, da Diretiva 85/337, um projeto incluído no ponto 20 do Anexo I da referida diretiva, como a construção de linhas aéreas de transporte de eletricidade de uma tensão igual ou superior a 220 kV e comprimento superior a 15 km, deve ser sujeito pelas autoridades competentes de um Estado-Membro ao processo de avaliação de impacto ambiental, mesmo que esse projeto seja transfronteiriço e que a parte situada no território desse Estado-Membro seja inferior a 15 km.

Acórdão Kraaijeveld BV
Este acórdão[2] tem por objeto uma decisão a titulo prejudicial sobre a interpretação da diretiva 85/337/CEE sobre a avaliação de efeitos de projetos públicos e privados no ambiente em especial sobre a obrigação de um órgão jurisdicional nacional de assegurar o cumprimento da diretiva que tem efeito direto. No caso em particular estava em causa um recurso de anulação para planos de ocupação de solos no âmbito de reforço de diques para obras de canalização dos cursos de água, e saber se este projeto teria que ser submetido a um estudo de avaliação dos efeitos no ambiente no âmbito da diretiva 85/ 337/CEE.

Neste processo, o Tribunal de Justiça foi confrontado com quatro questões prejudiciais a propósito da interpretação dos artigos 2.º, n.º 1 e 4.º, n.º 2 e do Anexo II da Diretiva  85/337/CEE do Conselho, de 27 Junho de 1995 relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente. As questões versam principalmente sobre os efeitos das obras de um dique ao longo de um curso de água e os seus impactos no ambiente. As dúvidas do tribunal neerlandês residiam, por um lado, em saber se as obras relativas a um dique ao longo de cursos de água estavam abrangidas pelo conceito de “Obras de canalização e de regularização dos cursos de água” contantes do Anexo II da Diretiva 85/337/CEE e se também estavam abrangidos a construção, a deslocação, o reforço, e a substituição de um dique. Por outro lado, o tribunal de reenvio pretendia quis saber se, tendo um Estado-Membro adotado, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, da Diretiva, critérios e limiares incorretos para um projeto referido no Anexo II da Diretiva, existe uma obrigação de submeter o referido projeto a um estudo de impacte ambiental nos termos do artigo 2.º, n.º 1, por esse poder constituir “um impacte significativo no ambiente nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização”. Por último, o tribunal nacional colocou a questão de saber se a obrigação que resulta da aplicação do artigo 2. º, n.º 1, da Diretiva, goza de efeito direto (se pode ser invocada pelo particular perante o juiz nacional) e se o juiz nacional a deve aplicar mesmo não tendo sido invocada pelo particular.

O Tribunal de Justiça declarou, em reposta às duas primeiras questões, que a expressão “obras de canalização e de regularização dos cursos de água” do Anexo II, ponto 10, alínea e) da Diretiva 85/337/CEE, deve ser interpretada no sentido que engloba as obras relativas a um dique ao longo de cursos de água, englobando não só a construção de um novo dique, mas também a modificação, a deslocação ou a substituição de um dique já existente, e também uma dessas situações combinadas. Quanto à terceira questão, o Tribunal de Justiça afirmou que o artigo 4.º, n.º 2, da Diretiva 85/337 e o Anexo II devem ser interpretados no sentido de que, quando um Estado-Membro fixa critérios para determinar os projetos relativos aos diques a um nível tal que, na prática, todos os projetos ficam subtraídos à obrigação de realizar o estudo sobre o impacte ambiental, excede a margem de apreciação concedida pelos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Diretiva 85/337, salvo se os projetos dos diques excluídos da avaliação não apresentam efetivamente efeitos significativos para o ambiente. O Tribunal de Justiça adiantou também que se, nos termos do direito nacional, um órgão jurisdicional tem a obrigação de suscitar ex officio os fundamentos de direito decorrentes de uma norma interna de natureza coerciva que não foram invocados pelas partes, compete-lhe igualmente verificar, no âmbito da sua competência, se as autoridades do Estado-Membro atuaram dentro dos limites da margem de apreciação estabelecida nos artigos 2.º, n.º 1 e 4.º, n.º 2, da Diretiva; quando tal margem de apreciação tiver sido ultrapassada, devem então ser afastadas as disposições nacionais, competindo às autoridades do Estado-Membro adotar todas as medidas necessárias, gerais ou especiais, para que os projetos sejam examinados a fim de saber se os mesmos podem eventualmente ter efeitos significativos no ambiente, e em caso afirmativo, para que os projetos sejam submetidos a um estudo do impacte ambiental

Acórdão Comissão das comunidades Europeias contra Irlanda
Este acórdão[3] tem por objeto a transposição da diretiva 85/337/CEE de 27 de Junho 1985 sobre a avaliação de efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente, onde a Irlanda foi acusada pela Comissão de ter procedido à uma transposição incorreta.

No presente acórdão, o Tribunal de Justiça (TJ) foi chamado a pronunciar-se numa ação intentada pela Comissão contra a Irlanda por incumprimento das obrigações resultantes da Diretiva 85/337/CEE por alegada transposição incorreta dos artigos 4º nº 4, do anexo II, ponto 1 alínea b), d) e d), ponto 2 alínea a), bem como dos artigos 2º nº3, 5º e 7º da Diretiva. A Diretiva prevê que os Estados-Membros devem, antes de aprovar um projeto que, pela sua natureza, dimensão ou localização, possa ter impactos significativos no ambiente, submeter tal projeto a uma avaliação dos seus efeitos. A Comissão notificou a Irlanda de que não tinha transposto corretamente a Diretiva. Em resposta, a Irlanda enviou dois diplomas legislativos que ainda não asseguravam uma correta transposição. A Comissão dirigiu assim um parecer onde censura a Irlanda e depois de várias correspondências foi instaurada a ação por incumprimento que está na origem do presente acórdão.

O TJ começou por lembrar, quanto aos argumentos da Irlanda, relativos as acusações feitas em fase pré-contenciosa, que a petição não podia basear-se em acusações diversas das indicadas no parecer fundamentado. de 1985 processo nº C-392/96. Quanto à questão das provas do incumprimento da Irlanda, a Irlanda alegou que a Comissão não tinha provado um abuso real da utilização dos limiares em causa (limiares estes que serviam para aferir se um projeto podia ser isento da obrigação de avaliação por não atingir os tais limiares fixados). O TJ declarou que o incumprimento censurado pela Comissão é a transposição incorreta do artigo 4º nº 2 da diretiva através da utilização de limiares que têm por efeito que o conjunto de características de um projeto não seja tomado em consideração para determinar se deve ser sujeito à avaliação, de modo que certos projetos que têm efeitos significativos no ambiente podem ser isentos da obrigação de avaliação porque não atingem os limiares fixados – ou seja, é o modo como a Diretiva foi transposta para a legislação irlandesa que é objeto do incumprimento, é o próprio texto da legislação que é em si insuficiente. Quanto ao artigo 2º nº1 e 4º nº2, a diretiva confere uma margem de apreciação aos Estados-Membros para fixarem critérios ou limiares a reter. Essa margem de apreciação tem os seus limites na obrigação enunciada no artigo 2 º nº1 de submeter a uma avaliação de impacte ambiental os projetos suscetíveis de ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização.

Assim, um Estado-Membro que fixe critérios só tendo em conta as dimensões do projeto (sem a natureza e localização) excede a margem de apreciação que lhe é confiada, pois um projeto com dimensões reduzidas pode ter efeitos significativos no ambiente quando situado num local em que os fatores como a fauna, flora, solo, água, clima ou património cultural, sejam sensíveis a mínima modificação. Por isso, o TJ concluiu que ao fixar limiares que só têm em conta as dimensões dos projetos com exclusão da sua natureza e localização relativamente às categorias de projetos referidos no anexo II, ponto 1, alínea d), e ponto 2 alínea a), a Irlanda ultrapassou a margem de apreciação de que dispõe nos termos do artigo 2º nº2 e 4º nº2.

Quando ao efeito cumulativo dos projetos, o TJ lembrou que um Estado-Membro que fixa critérios a um nível tal que na prática a totalidade dos projetos de um certo tipo ficaria subtraída à obrigação de avaliação de impacte ambiente, excede a margem de apreciação de que dispõe, salvo se a totalidade dos projetos excluídos possa ser considerada com base numa apreciação global não suscetivel de ter efeitos significativos no ambiente. É o caso de um Estado que fixa como critério de dimensão e não se assegura que o objetivo da regulamentação não será desviado através de um fracionamento dos projetos. A falta de tomada em consideração do efeito cumulativo dos projetos tem por resultado prático que a totalidade dos projetos de um certo tipo possa ser subtraída à obrigação de avaliação, ao passo que, considerados no seu conjunto, são suscetíveis de ter efeitos significativos no ambiente.

Quanto à violação do artigo 2 nº 3 que prevê um sistema de isenção que permite ao Ministro competente isentar um projeto de avaliação quando considerar que circunstâncias excecionais o justificam, apesar da Irlanda ter invocado ter adotado legislação modificativa, tais alterações são, segundo a jurisprudência do TJ, são irrelevantes numa ação por incumprimento. Assim, o TJ considerou a acusação relativa à violação do artigo 2º nº3 da Diretiva fundamentada.

Quanto à violação do artigo 5º da Diretiva, como a Irlanda não prevê qualquer disposição destinada ao exame da pertinência ou do caráter razoável do facto de pedir as informações especificadas no anexo III ao dono da obro e apesar de a Irlanda ter adotado legislação modificativa, pelo mesmo fundamento apresentado anteriormente, a violação do artigo 5º foi considerada fundamentada.

Quanto à violação do artigo 7º da Diretiva, a lei irlandesa prevê um mecanismo pelo qual as autoridades locais devem notificar o ministro do ambiente irlandês de qualquer pedido que possa ter consequências significativas no ambiente de um outro Estado Membro. Como não prevê uma obrigação expressa de transmissão das informações ao outro Estado Membro (como é o sentido original do artigo da Diretiva), a transposição foi considerada inadequada.

O TJ declarou a ação por incumprimento improcedente quanto ao restante.

Acórdão Comissão das comunidades Europeias contra Reino da Bélgica
Este acórdão[4] tem por objeto as diretivas 75/442, 76/464, 80/68, 84/360 e 85/337 e a transposição das medidas legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para proceder avaliação de projetos que possam ter impacto significativo no ambiente e saber se uma aceitação tácita resulta num incumprimento a luz também do artigo 189º do tratado CE.

Neste acórdão o Tribunal de Justiça (TJ) foi chamado a pronunciar-se sobre a transposição das Diretivas 75/442, 76/464, 80/68, 84/360 e 85/337, pelo Reino da Bélgica, nas regulamentações das Regiões de Flandres e Valónia.

As diretivas 75/442, 76/464, 80/68, 84/360 impõem aos Estados-Membros que adotem as medidas necessárias para assegurar que uma atividade ou instalação estejam sujeitas a uma autorização prévia. A diretiva 85/337 prevê no seu artigo 2º que os projetos que possam ter um impacto significativo no ambiente sejam submetidos a uma avaliação dos seus efeitos antes da concessão da sua aprovação. O direito belga transpôs as diretivas. No entanto, as Regiões de Flandres e Valónia preveem um regime de concessão e de recusas tácitas de autorizações.

A Comissão entendeu que o Reino da Bélgica não havia, por isso, transposto corretamente as diretivas. Alegou que o TJ já havia declarado que um sistema de autorização tácita era incompatível com as exigências da diretiva 80/681. O mecanismo de autorização tácita para projetos (que possam ter um impacto significativo no ambiente) era por isso incompatível com a diretiva em causa. O TJ lembrou a sua jurisprudência a propósito da diretiva pela qual é sempre necessário um ato expresso de proibição de autorização. Por isso, segundo o TJ uma autorização tácita não pode ser compatível com as exigências da diretiva.

Segundo o artigo 189º do Tratado, as diretivas vinculam os Estados-Membros quanto ao resultado a alcançar. Por isso, o Tribunal concluiu que o Reino da Bélgica não havia cumprido com as obrigações que lhe incumbem e, por não adotar as medidas legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para transpor integralmente as Diretivas 75/442/CEE, 76/464/CEE, 80/68/CEE, 84/360/CEE, 85/337/CEE, o Reino da Bélgica não havia cumprido as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 9.° da Diretiva 75/442, na redação dada pela Diretiva 91/156, 3.°, 4.°, 5.° e 7.° da Diretiva 76/464, 3.°, 4.°, 5.°, 7.° e 10.° da Diretiva 80/68, 3.°, 4.°, 9.° e 10.° da Diretiva 84/360, bem como 2.° e 8.° da Diretiva 85/337.

O direito europeu do ambiente e a sua proteção penal :
A decisão quadro 2003/80/JAI do Conselho e o acórdão do TJUE sobre o pedido de anulação

A decisão-Quadro 2003/80/JAI
O nosso primeiro objetivo vai ser analisar nas linhas gerais os objetivos da Decisão Quadro assim como os seus fundamentos, para a seguir analisar o porquê da sua revogação. A Decisão-Quadra do Conselho de 27 de Janeiro de 2003 relativa à proteção ambiental através do direito penal tem como fundamento principal o Tratado da União Europeia nomeadamente os artigos 29 e), os artigos 31 nº2 alinea b) e o artigo 34º. A iniciativa parte do Reino da Dinamarca e consta os pareceres do parlamento Europeu.

Os fundamentos da decisão quadro são em primeiro o aumento dos crimes e infrações contra ao ambiente e as consequências que daí advêm, nomeadamente em relação aos crimes transfronteiriços. Como estas infrações tem aumentado e constituem um perigo de ameaça grave para o ambiente vão ser preciso respostas e intervenções duras da União Europeia por isso como as preocupações pelo ambiente são de todos os Estados Membros o Conselho da Europa desejou garantir medidas de intervenção e uma proteção penal contra as infrações ambientais. Neste sentido, a Comissão das Comunidades Europeias já tinham apresentado uma proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho para a proteção ambiental através do direito penal.

No entanto, O conselho através da Decisão Quadro integrou algumas matérias da diretiva para definir que atos são infrações penais no direito penal como crimes ambientais. Foram feitas diversas alterações às propostas da diretiva, no entanto esta não chegou a ser aprovada pelo Conselho porque a maior parte dos Estados-Membros consideraram que esta diretiva excedia o âmbito de competências da antiga Comunidade pelo Tratado porque esta iria conferir poderes excessivos à União em matéria Penal. Deste modo o Conselho considerou que a simples Decisão Quadro já conseguiria alcançar os objetivos pretendidos baseando-se no título VI do Tratado da União Europeia. Através do artigo 34º do Tratado da União Europeia o Conselho consegue justificar a obrigação de os Estados - Membros preverem sanções penais. Temos que notar também que estas sanções penais não só poderão ser aplicadas às pessoas singulares mas também as pessoas coletivas para responsabilização por infrações penais contra o ambiente. Serve também de fundamento à decisão quadro a convenção de 1998 sobre a proteção do ambiente.

Uma vez justificados os motivos da decisão Quadro vamos relembrar , de forma breve, o que consagrava. Começando pelo artigo 1º que ecordava conceitos e definições essenciais como o que é considerado ilegal por efeito da lei ou seja violações de disposições vinculativas do direito da União destinadas a proteger o ambiente, assim como o que é considerado por águas, e por pessoa coletiva.

O artigo 2º preconiza que cabe aos Estados-Membros tomar as medidas adequadas para qualificar como infrações penais cometidas com dolo , como por exemplo relativamente a emissão de substancias ou radiações na atmosfera, aguas , solos que podem causar morte ou lesões graves as pessoas ou que podem causar deterioração de monumentos protegidos, bens, animais ou plantas ou dos próprios solos ou aguas, à mesma coisa quanto a eliminação , transporte ou armazenamento de resíduos. Também está previsto neste artigo a exploração ilegal de instalações onde se exerça uma atividade perigosa para o ambiente e para as pessoas , e que possa causar danos. Mas também todos o tipo de danos que possa causar o fabrico ou uso de qualquer forma de materiais nucleares e substâncias radioativas perigosas, assim como os danos que podem causar extinção de fauna , flora ou espécies ( através de posse, catura, danificação ou comercialização ilegal). E todos os danos que podem ser por causados na camada de ozono. O artigo 3º e 4º prevêm a tomada de medidas necessárias para garantir a aplicação do artigo 2º mas também de todos os mesmo crimes cometidos com negligência ou negligência grave.

Segundo o artigo 5º estas sanções penais terão que ser suficientes para serem dissuasivas e proporcionais às infrações cometidas, indo em alguns casos até as penas privativas de liberdade ou mesmo extradição e pode até ir à proibição de uma pessoa exercer uma atividade de gerência considerada criminosa para o ambiente. Como já referimos as pessoas coletivas também podem ser responsabilizadas nomeadamente as pessoas coletivas encarregadas de gerência destas atividades. O artigo 8º prevê o tipo de jurisdição aplicável , ou seja, que será da competência de cada Estado-Membro tomar as medidas necessárias na sua jurisdição por infrações cometidas no seu território , a bordo de navio / aeronave no seu pavilhão, assim como as jurisdições relativas a crimes transfronteiriços e permitir assim instauração de processo, extradição de pessoas, e haver uma cooperação para informação de instauração de processos num Estado contra nacional doutro Estado-Membro. Os Estados membros são por isso obrigados a tomar todas as medidas necessárias ao cumprimento desta decisão quadro, e de transmitir os textos que se demonstraram necessários para isso.

Por último foi definido que a decisão-Quadro produz efeitos com a sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia e que se aplica também a Gibraltar. São estas as linhas gerais da Decisão Quadro 2003/80/JAI.

O Acórdão do processo C-176/03 e o pedido de anulação da Decisão Quadro 2003/80/JAI
No processo C-176/03 de 13 Setembro 2005[5] que envolvia a Comissão das Comunidades Europeias e o Parlamento Europeu contra o Conselho da União Europeia, o Tribunal de Justiça decidiu a revogação da Decisão- Quadro 2003/80/JAI , vamos analisar o caso em questão e os motivos de tal decisão.

Quanto ao Quadro jurídico antecedente ao litigio , já percebemos que estava em causa a adoção da decisão quadro de 27 Janeiro de 2003 do Conselho da União Europeia ( cuja iniciativa partia do Reino da Dinamarca). Já vimos os fundamentos da Decisão Quadro que se baseava no antigo Tratado da união Europeia e na preocupação crescente resultante das infrações contra o ambiente. No seguimento da Decisão-Quadro a Comissão pronunciou-se defendendo que não concordava com a base jurídica da Decisão que obriga os Estados-Membros a prever sanções penais para infrações contra o ambiente. Pelo contrário segundo a Comissão a base jurídica que teria sido a mais conveniente seria a resultante do artigo 175º nº1 CE, pronuncias estas que foram apoiadas e acolhidas também pelo Parlamento Europeu em Abril 2002. O Parlamento Europeu defendia que a decisão-quadro deveria ser um instrumento jurídico complementar á uma proposta de diretiva a adotar em matéria de proteção ambiental e só relativamente a uma cooperação judiciária. Como tínhamos percebido anteriormente, o Conselho não adotou a diretiva mas incorporou na decisão Quadra algumas disposições que faziam parte da tal proposta e defendeu que o artigo 34º do TUE era o instrumento o mais apropriado para defender a obrigação de os Estados preverem sanções penais e por isso a Decisão-Quadro tinha sido adotada. A Comissão tinha defendido que esta decisão-quadro não era o instrumento jurídico o mais adequado para exigir a aplicação de sanções penais , e isto porque pelo artigo 2º do Tratado da CE , a Comissão não considera como competente para exigir a imposição de sanções penais e mais a Comissão reiterou que a sua proposta de diretiva ( que acompanhava a decisão quadro ) não tinha sido convenientemente analisada.

Quanto ao recurso, “ Por despacho do presidente do Tribunal de 29 de Setembro de 2003, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha, a República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a Irlanda, o Reino dos Países Baixos, a República Portuguesa, a República da Finlândia, o Reino da Suécia e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por um lado, e o Parlamento, por outro, fora autorizados a intervir em apoio dos pedidos, respectivamente, do Conselho e da Comissão.” ( Considerando nº12).

Deste modo, vamos analisar os argumentos invocados pelas partes para entender a seguir a decisão do Tribunal de Justiça. A Comissão contestou o fundamento da decisão quadro baseado no artigo 34º , 29º e 31º UE , segundo esta a competência comunitária ambiental em matéria penal passa antes pelo artigo 175º CE ( e 174º e 176º CE) para poder impor aos Estados-Membros sanções penais quando haja infrações a regulamentação comunitária nessa matéria, pois este processo passaria por uma harmonização das legislações penais nomeadamente os elementos constitutivos das infrações penais ambientais. Apesar de não haver precedentes nesta matéria a Comissão recordou jurisprudência do Tribunal de justiça quanto ao dever de lealdade, e princípios da efetividade e equivalência. Já existam domínios como na politica da pesca e transporte onde há o recurso ao direito penal para impor sanções pelos Estados- Membros.

Desta forma a Comissão alegou a anulação mesmo que parcial da Decisão- Quadro , “porquanto os seus artigos 5.°, n.° 2, 6.° e 7.° dão aos Estados-Membros a liberdade de estabelecer outras sanções para além das de natureza penal, ou mesmo de optar entre sanções penais e outras sanções, o que se inclui indubitavelmente no âmbito da competência comunitária. O maior problema residia na fundamentação com base no titulo VI do Tratado da União Europeia para as decisões, e para ação penal pois como estas disposições não podem ter uma existência autónoma Comissão teve que pedir a anulação da totalidade da decisão – quadro. Outro problema com a decisão – quadro justifica-se por um desvio de procedimento já que a proposta da diretiva não ter sido adotada pela maioria dos Estados não reconhecer à antiga Comunidade uma competência necessária para impor aos Estados-Membros a obrigação de prever sanções penais para as infrações contra o ambiente. O Parlamento apoiou a argumentação toda da Comissão, principalmente na parte da fundamentação para exigir a imposição de infrações penais que devia ter sido nos artigos 175ºCE e 251ºCE. Resumindo a principal argumentação para a revogação da decisão quadro 2003/80 /JAI consistiu na fundamentação e numa falta de aceitação geral por parte dos Estados Membros em aceitar que a União ( antiga Comunidade) possa intervir no Estados Membros exigindo-lhes de impor sanções penais , pois a competência da Comunidade no direito penal dos Estados-Membros considerado como um simbolo e garantia de soberania, não veio implicitamente através do artigo 175ºCE. O Tribunal de Justiça nas suas jurisprudências que serve de precedente vinculativo nunca impos aos Estados- Membros de adotar sanções penais, a sanção só tem que ter um caracter efetivo, dissuasivo e proporcional, e há um dever dos Estados de atuar com a mesma diligencia quando aplicam normas comunitárias do que quando aplicam normas internas. O problema prende-se que antes disso nunca o Tribunal de justiça afirmou existir uma obrigação de harmonização das normas penais. Mais cada vez que se tentou legislar ou influenciar o direito penal com um ato comunitário foi através de uma decisão-quadro que se introduziram as matérias penais ( e nunca no próprio ato).

No nosso caso, está mesmo em causa uma harmonização do direito penal, e o facto de esta harmonização se basear no direito do ambiente e nas infrações ambientais, não justifica por só a competência da União Europeia. Com efeito, resulta da finalidade e do conteúdo da decisão-quadro que esta tem por objeto, de forma geral, garantir a harmonização das disposições penais nos Estados-Membros. O facto de poderem estar em causa normas adotadas ao abrigo do Tratado CE não é decisivo. Depois de ter analisado o conteúdo dos argumentos das partes e a matéria de facto e direito, o Tribunal de Justiça sustentou que pelo artigo 47º da EU, nenhuma disposição do Tratado CE pode afetar uma disposição do Tratado da União Europeia. Como é da competência do Tribunal de Justiça certificar-se que o Conselho no âmbito do titulo VI do Tratado CE não invade a esfera de competências atribuídas à Comunidade, por isso tem que verificar se a Decisão Quadro nos seus artigos 1º a 7º não afeta a competência que a Comunidade detém pelo artigo 175º CE ( uma vez que a diretiva não foi fundamentada com base neste artigo há que ver a sua conformidade com este artigo). O Tribunal de Justiça reconheceu a sua competência no domínio da proteção do ambiente por este constituir um objetivo essencial da Comunidade e assim de prever o desenvolvimento de uma política no domínio ambiental, isto segundo o artigo 2º CE e pelo artigo 6º CE que reforça o carácter transversal e fundamental desta proteção do ambiente pela Comunidade (atual União). Segundo o Tribunal de Justiça , os fundamentos que orientam a politica comunitária no domínio do ambiente são os artigos 174º a 176º da CE, onde estão elencados os objetivos e procedimentos da Comunidade no domínio ambiental. A competência que resulta destes artigos é que cabe ao Conselho decidir, por unanimidade sob proposta da Comissão e depois de uma consulta tanto do Parlamento como dos Comités ( artigo 175º nº2). O Tribunal recordou também que segundo jurisprudência assente que um ato comunitário devia basear-se em elementos que sejam susceptíveis de fiscalização jurisdicional quando ao fim e ao conteúdo do ato.

A Decisão-Quadro prossegue objetivos de proteção do ambiente que podemos logo identificar na epigrafe nos primeiros considerandos. Para conseguir esta proteção ambiental nos artigos 2º a 7º da Decisão-Quadro , notamos que há uma lista dos comportamentos considerados como infrações graves para o ambiente que devem ser alvos de sanções penais, E que exigem uma harmonização em parte das legislações penais nos Estados-Membros sobretudo no que é considerado como uma infração penal, decorre dos Acordãos Casati (1981) , e Lemmons (1998)que as regras do processo penal não são em principio abrangidas pelo âmbito decompetências da  União ( antiga Comunidade). Mas o Tribunal reconhece que, devido à importância da proteção ambiental e as infrações ambientais graves , o legislador comunitário não pode ser impedido de tomar algumas medidas necessárias com o direito penal dos Estados membros para garantir a eficácia das normas de proteção ambiental , pois o direito penal continua a ser um domínio forte e dissuasor. Nota-se que nos artigos 1º a 7º da decisão quadro os Estados-membros têm competência para escolher que sanções penais vão ser aplicáveis ( devendo estas serem proporcionais, efetivas e dissuasoras). O Tribunal de Justiça defendeu que os objetivos de proteção do ambiente da decisão-quadro poderia ter sido validamente adotada e fundamentados com base no artigo 175º CE. O facto de os artigos 135.° CE e 280.°, n.° 4, CE reservarem, nas áreas da cooperação aduaneira e do combate às ofensas aos interesses financeiros das Comunidades, a aplicação do direito penal e da administração da justiça aos Estados- Membros não é suscetível de infirmar esta conclusão. Com efeito, não se pode deduzir destas disposições que, no âmbito da execução da política do ambiente, toda e qualquer harmonização penal - ainda que tão limitada quanto a que resulta da decisão-quadro — deva ser afastada, não obstante ser necessária para garantir a efectividade do direito comunitário. Por isso, como a Decisão Quadro invade o conjunto de competências do artigo 175º o Tribunal de Justiça afirmou que a decisão quadro invade na sua totalidade, devido ao seu carater indivisível , o artigo 47º da UE. Desta forma não é preciso uma anulação parcial da decisão quadro como o sugeriu a Comissão. Por estes motivos todos , o Tribunal de Justiça decidiu pela revogação da Decisão Quadro 2003/80/JAI. Concluindo o Conselho da Europa foi condenado nas despesas e a Decisão Quadro 2003/80/JAI anulada.

Acórdão Comissão e Parlamento Europeu contra Conselho da U.E
O presente acórdão[6] tem por objeto um pedido de anulação da decisão- quadro 2005/667/JAI do Conselho de 12 de Julho 2005 que estabelece um quadro penal para a repressão da poluição dos navios, e a diretiva 2005/35 sobre a segurança marítima e a proteção ambiental , nomeadamente o artigo 47º e 80 nº2 .

A matéria de fato do acórdão começa com o seguinte : O Conselho da União Europeia adotou, por iniciativa da Comissão, a Decisão- Quadro 2005/667/JAI que institui um instrumento através do qual a União Europeia pretende aproximar as legislações dos Estados-Membros em matéria penal, obrigando-os a prever sanções penais comuns a fim de lutar contra a poluição dos navios intencionalmente ou por negligência grave causada no ambiente. A Decisão-Quadro prevê sanções e molduras penais, incluindo prisão, multas e coimas, tanto para pessoas singulares como para pessoas coletivas. A Decisão-Quadro foi criada pelo Conselho para atingir os objetivos prosseguidos pela Diretiva 2005/35: um nível elevado de segurança e de proteção do ambiente no transporte marítimo.

A Comissão declarou que a Decisão-Quadro não constituía o instrumento jurídico mais apropriado para impor aos Estados-Membros a penalização das descargas ilegais de substâncias poluentes no mar e a aplicação de sanções de natureza penal correspondentes ao nível nacional. A Comissão, como o defendeu em acusações anteriores sobre a decisão-quadro “proteção do ambiente pelo direito penal”, considera que, para efeitos de alcançar os objetivos previstos no artigo 2º do Tratado CE, a Comunidade tem competência para exigir aos Estados-Membros que prevejam sanções  penais, ao nível nacional, quando isso seja necessário para atingir objetivos comunitários. É o que se passa, nomeadamente, com a poluição causada por navios cuja base é o artigo 80º, nº 2, do Tratado. Considerando que a Decisão-Quadro 2005/667 não foi adotada com fundamento na base jurídica adequada, em violação do artigo 47º UE, a Comissão interpôs recurso de anulação da referido Decisão-Quadro.

Quanto à apreciação do Tribunal de Justiça (TJ), o TJ recordou que, por força do artigo 47º UE, nenhuma disposição do Tratado CE pode ser afetada por uma disposição do Tratado EU, sendo da competência do TJ certificar-se que os atos praticados pelo Conselho não invadem a esfera de competências que as disposições do Tratado CE atribuem à Comunidade. O TJ afirmou que a política dos transportes está inserida nos fundamentos da Comunidade segundo os artigos 70º CE e 80º CE e, por isso, o legislador comunitário podia adotar as medidas destinadas a aumentar a segurança dos transportes marítimas, que não é posta em causa pela circunstância de, no caso, o Conselho não ter julgado oportuno adotar as disposições da Decisão-Quadro 2005/667 com fundamento no artigo 80º, nº 2, CE. É jurisprudência assente que o ato comunitário deve assentar em elementos objetivos capazes de serem alvos de fiscalização jurisdicional entre os quais figuram a finalidade e o conteúdo do ato. O preâmbulo da Decisão-Quadro 2005/667 define que tem por objetivo melhorar a segurança marítima e a proteção do ambiente contra a poluição causada por navios, através da aplicação de sanções penais e administrativas. O TJ lembrou a sua jurisprudência pela qual o legislador comunitário pode aplicar sanções penais quando estas constituam uma medida indispensável para lutar contra infrações graves ao ambiente e garantir assim a pela eficácia das suas normas. Por isso, o TJ reiterou que tendo em conta os objetivos da Decisão-Quadro, estes inserem-se nos fundamentos do artigo 80º, nº 2, CE. No entanto, quanto à fixação do tipo e do grau de sanções penais a aplicar, contrariamente ao que sustenta a Comissão, essa matéria não é da competência da Comunidade. O legislador comunitário não pode adotar disposições como as previstas no artigo 4º e 5º da Decisão-Quadro 2005/667, na medida em que essas dizem respeito ao tipo e ao grau de sanções penais aplicáveis. Essas disposições não foram adotadas com base no artigo 47º UE. Deste modo, o TJ concluiu que a Decisão-Quadro 2005/667/JAI, ao invadir a esfera de competências do 80º, nº 2, CE, viola o artigo 47º UE, devendo, atendendo à indivisibilidade da Decisão-Quadro, ser anulada na integra.

Conclusão e considerações finais : A possível proteção do ambiente em matéria penal através do TFUE
Reparamos então da análise destes acórdãos do Tribunal de Justiça que existe um desentendimento geral que a União Europeia não tem competência em matérias penais mesmo quando se diz respeito à proteção do ambiente. Apesar de desde as primeiras consagrações da proteção do ambiente pela União Europeia ter já sido adotado várias diretivas que visam uma proteção ambiental e o reforço de sanções aplicáveis aos poluidores e infratores ( graves) ambientais, ainda não temos uma proteção penal do ambiente. A pergunta que colocamos aqui hoje é se futuramente não haverá possibilidade de integrar os crimes ambientais e ,a consequente garantia pelo direito penal , através do artigo 83º do Tratado de funcionamento sobre União Europeia. Vamos recordar o artigo 83º do TFUE para perceber como podíamos levantar a questão de se é possível integrar crimes ambientais graves aí :

“ Artigo 83.º
(ex-artigo 31.º TUE)
1. O Parlamento Europeu e o Conselho, por meio de directivas adoptadas de acordo com o processo legislativo ordinário, podem estabelecer regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções em domínios de criminalidade particularmente grave com dimensão transfronteiriça que resulte da natureza ou das incidências dessas infrações, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns. São os seguintes os domínios de criminalidade em causa: terrorismo, tráfico de seres humanos e exploração sexual de mulheres e crianças, tráfico de droga e de armas, branqueamento de capitais, corrupção, contrafação de meios de pagamento, criminalidade informática e criminalidade organizada. Consoante a evolução da criminalidade, o Conselho pode adotar uma decisão que identifique outros domínios de criminalidade que preencham os critérios referidos no presente número. O Conselho delibera por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu.

2. Sempre que a aproximação de disposições legislativas e regulamentares dos Estados- Membros em matéria penal se afigure indispensável para assegurar a execução eficaz de uma política da União num domínio que tenha sido objecto de medidas de harmonização, podem ser estabelecidas por meio de directivas regras mínimas relativas à definição das infracções penais e das sanções no domínio em causa. Essas directivas são adoptadas de acordo com um processo legislativo ordinário ou especial idêntico ao utilizado para a adoção das medidas de harmonização em causa, sem prejuízo do artigo 76.º.

3. Quando um membro do Conselho considere que um projeto de diretiva a que se refere o n.º 1 ou n.º 2 prejudica aspetos fundamentais do seu sistema de justiça penal, pode solicitar que esse projeto seja submetido ao Conselho Europeu. Nesse caso, fica suspenso o processo legislativo ordinário. Após debate, e havendo consenso, o Conselho Europeu, no prazo de quatro meses a contar da data da suspensão, remete o projecto ao Conselho, o qual porá fim à suspensão do processo legislativo ordinário. No mesmo prazo, em caso de desacordo, e se pelo menos nove Estados- Membros pretenderem instituir uma cooperação reforçada com base no projeto de diretiva em questão, esses Estados-Membros notificam o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão em conformidade. Nesse caso, considera-se que foi concedida a autorização para proceder à cooperação reforçada referida no n.º 2 do artigo 20.º do Tratado da União Europeia e no n.º 1 do artigo 329.º do presente Tratado, e aplicam-se as disposições relativas à cooperação reforçada.”.

Resulta do nº1 do artigo 83º do TFUE que o Parlamento e o Conselho têm competência em matéria penal para intervir com regras mínimas de sanções penais , e isto sempre que estejam em causa crimes graves em domínio transfronteiriço. Ora um crime ambiental grave poderia ser considerado um crime transfronteiriço por excelência uma vez que o ar, os solos, as aguas e o meio ambiente não pertence e não tem repercussões só num território. Um crime ambiental grave tem pelo contrário consequências negativas que podem vir a ser extremamente graves para muitos Estados Membros, sobretudo a nível da poluição dás águas e a níveis nucleares ( não precisamos claro de recordar o incidente de Chernobyl e os efeitos para parte da Europa ), por isso o crime ambiental grave ( com danos graves nas fauna, flora, águas e para as espécies , como os enunciados no artigo 2º da antiga revogada Decisão-Quadro 2003/80/JAI) devia ser considerado o crime transfronteiriço por excelência. Não há crime tão susceptivel de poder afetar vários Estados Membros como o crime ambiental grave. No entanto, os crimes transfronteiriços cuja competência o Conselho tem para criar regras quanto as sanções penais nos Membros estão previstos na 2ª parte do artigo 83º do TFUE, e de fato ainda não estão previstos os crimes ambientais ( temos o tráfico de seres humanos, exploração sexual, branqueamento de capitais..).contudo na parte final do nº1 artigo 83º do TFUE prevê a possibilidade de o Conselho poder adotar decisões que alarga a lista de crimes previstos e consequentemente os domínios em que pode haver uma intervenção penal do legislador Europeu e isto tudo consoante a evolução da criminalidade. Ora, os crimes ambientais e a poluição tem aumentado cada vez mais dentro do espaço Europeu, segundo os relatórios da Comissão e das Agências para proteção ambiental e estamos perante um bem que não tem um valor diminuto, estamos a falar do nosso planeta e do meio onde vivemos , e há que sublinhar que não há possível reparação nem remédios para recuperar o que foi perdido no nosso meio ambiente. Perante isto e consoante a constante evolução dos crimes ambientais cometidos sem haver meios eficazes de proteção e de dissuasão ,pois as meras taxas de poluidor –pagador não tem resultado esperado muitas vezes, os próprios agentes poluidores ou empresas infratoras preferem pagar estas taxas do que mudar o modo de exercício das suas atividades ou o custo de uma renovação das técnicas das empresas com energias green acabam por ter um custo maior do que o pagamento das próprias taxas de poluição, por isso os ditos poluidores preferem pagar estas sanções pecuniárias.

Devemos levantar a questão se já não tocou o alarme para acordar os Estados Membros e o legislador europeu para através de uma decisão do Conselho ( aprovado pela comissão e parlamento) , se não se devia prever , com base no artigo 83º do TFUE ,como crimes transfronteiriços os crimes ambientais graves e assim garantir sanções penais orientadas pelo legislador europeu nos Estados-Membros e assim recuperar de alguma forma parte da ideias da Decisão Quadro 2003/80/JAI e da Decisão-Quadro 2005/667/JAI quanto à proteção ambiental garantida através do Direito penal europeu.



Por Amélie Fernandes


Julho de 2014



[1] Acórdão TJUE ( segunda secção) , Karnten, de 10 de dezembro de 2009 , processo nº C-205/08.

[2] Acórdão TJUE , Kraaijeveld , de 24 de Outubro de 1996, processo nº C-72/95.

[3] Acórdão TJUE ( quinta secção), Comissão das Comunidades Europeias contra Irlanda, de 27 de Junho
[4] Acórdão TJUE ( Terceira Seção), Comissão das Comunidades Europeias contra Reino da Bélgica, de 14 junho de 2001, processo nº C-320/00.

[5] Acórdão TJUE, Comissão contra conselho de 13 de Setembro de 2005, processo nº C-176/03.
[6] Acórdão TJUE ( Grande Secção) , Comissão contra Conselho , de 23 de Outubro de 2007, Processo nº C-
440/05.



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